por Paulo Jordanesson Falcão**
Na última sexta-feira (11), um temporal atingiu cidades do estado de São Paulo, causando transtornos significativos para a população. Entre os principais efeitos está a interrupção do fornecimento de energia elétrica para mais de 500 mil imóveis. De acordo com boletim recente da Enel, responsável por 70% da distribuição de energia elétrica no estado, pelo menos 354 mil clientes ainda seguiam na segunda-feira, sem luz somente na capital paulista. Esse evento reacendeu o debate sobre a privatização de empresas públicas essenciais, especialmente em setores críticos como o de energia e tecnologia da informação.
A Enel Distribuição São Paulo, uma das maiores concessionárias de energia elétrica do Brasil, atualmente atende cerca de 7,5 milhões de unidades em 24 municípios paulistas. Privatizada em 2018, empresa passou a integrar o grupo italiano Enel, e desde então, tem sido alvo de questionamentos sobre a qualidade dos serviços prestados, especialmente durante emergências como a que aconteceu no dia 11. A demora no restabelecimento da energia após eventos climáticos intensos expõe fragilidades na resposta rápida e eficiente por parte da concessionária.
Esse cenário abre espaço para uma reflexão mais ampla: até que ponto a privatização de serviços essenciais melhora a qualidade e agilidade no atendimento à população? Quais os reais impactos da transferência de controle público para o privado, especialmente em empresas que lidam com bens e serviços estratégicos para o funcionamento da sociedade?
O debate sobre privatizações não se limita ao estado de São Paulo. No Paraná, discute-se a possível privatização da Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (Celepar), sinalizada na Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP). A Celepar, que há mais de 60 anos atua como braço tecnológico do governo paranaense, é responsável pelo armazenamento e gestão de dados sensíveis e críticos de milhões de cidadãos e de órgãos públicos. Seu papel vai além de fornecer soluções tecnológicas, sendo um pilar para a segurança de informações relacionadas à saúde, educação, justiça, legislativo e outros serviços essenciais do estado.
A privatização da Celepar levanta preocupações profundas sobre a segurança e privacidade dos dados dos cidadãos. Em um cenário onde dados são considerados “o novo petróleo”, há o risco de que informações pessoais, inclusive aquelas protegidas por leis como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), possam ser expostas ou utilizadas de maneira inadequada no mercado, seja para fins comerciais ou até mesmo para manipulação de opinião pública.
Além disso, há o temor de que, nas mãos de uma empresa privada, a Celepar possa priorizar interesses comerciais em detrimento do compromisso público, impactando a eficiência e acessibilidade dos serviços oferecidos aos paranaenses. A experiência da Enel em São Paulo, que após anos de privatização ainda enfrenta desafios na gestão de crises e no atendimento, serve como um alerta.
Tanto no caso da Enel em São Paulo quanto no da Celepar no Paraná, o ponto central do debate é o equilíbrio entre eficiência operacional e a responsabilidade social que uma empresa pública carrega. Privatizar significa transferir essa responsabilidade para uma organização cujo foco principal, muitas vezes, é o lucro. No setor de energia, os apagões recentes demonstram que a privatização não trouxe necessariamente a melhoria prometida em termos de resposta a emergências.
No caso da Celepar, o risco é ainda maior, pois se trata de uma empresa que administra dados essenciais à vida pública. Se a Enel, responsável por um serviço já complexo como a distribuição de energia, encontra dificuldades para atender rapidamente em momentos de crise, o que esperar de uma empresa privada administrando informações sensíveis de milhões de pessoas? O governo, como administrador desses dados, deve garantir que interesses comerciais não se sobreponham à privacidade, à segurança e ao bem-estar dos cidadãos.
A privatização de serviços essenciais, como a energia e a tecnologia da informação, requer uma análise cuidadosa e profunda de seus impactos a curto e longo prazo. No caso da Celepar, os riscos vão além do operacional: estão diretamente ligados à privacidade e à soberania de dados, um patrimônio que deve ser protegido de maneira rigorosa.
O desafio para o poder público é encontrar formas de modernizar e otimizar empresas como a Celepar sem comprometer a segurança dos dados de seus cidadãos. Privatizar, especialmente em setores estratégicos, pode não ser a melhor resposta quando o bem-estar da sociedade está em jogo.
** Advogado Comitê de Trabalhadores contra a Privatização da Celepar