A jornada de Luciana Gambatto, 52 anos, moradora de Viamão (RS), ilustra uma dura realidade enfrentada por muitos sobreviventes de câncer de mama: a dificuldade de se reinserir no mercado de trabalho após o diagnóstico e tratamento da doença. Diagnosticada em 2021 com câncer de mama metastático, que se espalhou para os ossos, Luciana, que se identifica como balconista de farmácia, não conseguiu se recolocar profissionalmente. Sua história expõe a falta de acolhimento e as barreiras enfrentadas por pacientes oncológicos no ambiente corporativo.
O diagnóstico de Luciana foi descoberto a partir de dores intensas no pescoço. “Fiz exames e o raio X acusou que podia ser um mieloma múltiplo. Fiquei internada, fiz a coleta da medula e nela descobrimos que uma metástase do câncer de mama havia destruído o disco entre minha terceira e a quarta vértebra”, relata. Apesar das mamografias inconclusivas iniciais, a biópsia revelou tumores em ambas as mamas, ocultos atrás de glândulas de gordura.
Após seis sessões de quimioterapia e um delicado procedimento cirúrgico para implantação de uma prótese na coluna, Luciana superou o tratamento. No entanto, os impactos financeiros da doença persistem. “Recebi o auxílio-doença, mas mal conseguia pagar meu deslocamento e alimentação. Os exames, que muitas vezes precisava fazer no particular, também não consegui bancar”, lamenta. A dificuldade em retornar ao trabalho, tanto em sua função anterior quanto em outras posições, agrava a situação.
A experiência de Luciana reflete um problema mais amplo. Um levantamento da Femama, em parceria com o DataFolha e a AstraZeneca, revelou que quatro em cada dez mulheres brasileiras deixam de trabalhar após o diagnóstico de câncer de mama. A mastologista Maira Caleffi, presidente fundadora da Femama, ressalta que “quase um terço das brasileiras empregadas antes do diagnóstico não retorna mais ao mercado de trabalho, mesmo após o tratamento”.
Além das dificuldades financeiras, Luciana enfrentou a falta de solidariedade da empresa onde trabalhava. “A empresa em que trabalhei em nenhum momento se mostrou solidária. Ao contrário, no momento mais difícil, me ligaram para saber se meu caso era realmente grave, sem mostrar nem um pouco de empatia”, desabafa. A balconista, que atualmente recebe aposentadoria por invalidez, denuncia a falta de acolhimento e a ineficácia das leis de proteção aos pacientes oncológicos no mercado de trabalho.
Mesmo com opções de tratamento disponíveis no SUS, os custos indiretos, como transporte e alimentação, pesam no orçamento das pacientes. Luciana precisou recorrer à Justiça para garantir o acesso à medicação prescrita por sua oncologista. “Mesmo tendo plano de saúde, me negaram duas vezes o fornecimento da medicação que eu precisava tomar imediatamente. Precisei pagar advogado para conseguir um remédio que era meu direito”, relata.
Diante desse cenário, Luciana se uniu ao grupo Viamama, uma rede de apoio que oferece palestras, campanhas e acolhimento para mulheres com câncer de mama. A iniciativa busca preencher as lacunas deixadas pelo poder público e oferecer suporte às pacientes. A mastologista Maira Caleffi destaca que sintomas persistentes como fadiga, alterações na função do braço, problemas cardíacos e menopausa precoce podem dificultar o retorno ao trabalho, reforçando a importância de um acompanhamento multidisciplinar e do apoio familiar e social.
Fonte: http://www.metropoles.com