sábado, junho 28, 2025

Judicialização Ameaça Aéreas Brasileiras: Indústria de Processos Inflaciona Custos e Afasta Investimentos

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As companhias aéreas que operam no Brasil enfrentam um cenário desafiador. Em cinco anos, as três maiores empresas do setor precisaram recorrer à recuperação judicial, revelando a fragilidade financeira impulsionada por custos operacionais elevados e um fenômeno crescente: a judicialização.

A percepção do setor é que se instaurou uma verdadeira “indústria” de processos contra as aéreas. Esse aumento significativo de ações judiciais não só eleva os custos para as empresas, mas também impacta o preço das passagens aéreas, desestimulando a entrada de novos players no mercado.

Dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) revelam um aumento alarmante nos custos com processos movidos por clientes. De R$ 586 milhões em 2018, esses custos saltaram para R$ 1,16 bilhão em 2023, último ano com dados consolidados, demonstrando o impacto financeiro da judicialização.

O crescimento exponencial de ações judiciais é impulsionado por estratégias de comunicação agressivas. Empresas especializadas realizam uma “busca ativa” por passageiros potencialmente lesados, oferecendo representação em casos de atrasos, cancelamentos e extravios de bagagens, muitas vezes através de anúncios online e outdoors.

Ricardo Bernardi, consultor jurídico da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), destaca a singularidade do cenário brasileiro. “Virou uma lógica de penalização. Atrasos e cancelamentos se tornaram uma commodity, e muitas pessoas passaram a buscar indenizações como oportunidade, não como reparação legítima”, afirma.

O Brasil registra uma ação judicial a cada 0,52 voos, contrastando drasticamente com os Estados Unidos, onde a proporção é de uma ação a cada 2.585 voos, conforme dados do Bernardi & Schnapp Advogados. Essa disparidade demonstra a dimensão do problema no país.

Um levantamento da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) em parceria com a Iata revela que cerca de 90% das ações ajuizadas contra companhias aéreas brasileiras são por dano moral. O custo médio dessas indenizações é de R$ 6,7 mil, representando um ônus significativo para o setor.

Tomé Franca, secretário Nacional de Aviação Civil, defende um equilíbrio entre os direitos dos passageiros e a “excessiva judicialização”. “É preciso reconhecer o direito legítimo do passageiro lesado, mas também enfrentar um fenômeno que ganhou dimensão internacional”, ressalta.

Os atrasos e remarcações de voos figuram entre as principais causas de reclamações. Dados da Anac apontam que novembro e dezembro de 2024 registraram a maior taxa de atraso de voos domésticos dos últimos quatro anos, com 12,7% e 12,4% dos voos atrasando pelo menos 30 minutos, respectivamente.

Contraditoriamente, as companhias aéreas brasileiras figuraram entre as mais pontuais do mundo em 2024, de acordo com um relatório da Cirium. A Latam e a Azul ocuparam a quarta e sexta posições, respectivamente, com índices de pontualidade superiores a 82%, evidenciando um paradoxo no setor.

A Abear divulgou um mapeamento dos processos judiciais abertos contra as companhias brasileiras entre 2020 e 2023, que, segundo o setor, ampara o conceito de “litigância predatória”. O estudo revelou que cerca de 10% dos 400 mil processos analisados foram movidos pelos mesmos 20 advogados ou escritórios.

A Abear defende uma abordagem multifacetada para contornar o problema. A associação espera definições do Judiciário e Legislativo sobre o entendimento de dano moral presumido, que atualmente dispensa o cliente de comprovar danos além dos materiais.

John Rodgerson, CEO da Azul, revelou que o Brasil concentra 92% das ações judiciais do setor em todo o mundo, apesar de representar apenas 3% dos voos globais. Segundo ele, esse cenário encarece o valor das passagens e afasta empresas do mercado brasileiro. “Temos que seguir o que é feito em outros países. Determina-se: se atrasar um voo é ‘x’, se perde mala é ‘y’. É isso que deve ser seguido”, afirmou Rodgerson.

Leo Rosenbaum, advogado especialista em direito do passageiro aéreo, rejeita a crítica de judicialização excessiva, mas distingue seu escritório das empresas que trabalham com captação em massa de ações. “Atuamos dentro dos limites do que a OAB permite”, garante.

Rosenbaum observa que o Judiciário tem exigido mais documentos e audiências, afetando até os escritórios tradicionais. “Os problemas dos consumidores continuam frequentes, mas as decisões judiciais têm reduzido valores de indenizações e exigido mais provas”, explica.

Danton Boechat, do escritório Boechat e Bittencourt, que atua no segmento desde 2019, afirma que seu escritório representa causas apenas quando há violação concreta. Boechat relata que assistências obrigatórias previstas pela Anac são frequentemente descumpridas, o que impede a redução do mercado de representação contra as companhias.

Fonte: http://www.infomoney.com.br

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