* Por Rita Silva
Empreender fora do Brasil já é, por si só, um ato de coragem. Exige adaptação, resiliência e uma dose diária de estratégia para lidar com as peculiaridades culturais, legais e econômicas do país de destino. Mas quando o cenário internacional muda de forma repentina, como no caso recente do chamado “tarifaço” dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, a coragem, por si só, deixa de ser suficiente. É preciso recorrer ao conhecimento técnico e jurídico para sobreviver e reagir.
As novas tarifas impostas pelo governo americano atingem diretamente setores-chave da economia brasileira, como aço, alumínio, alimentos industrializados e até commodities agrícolas. Amparadas pela Trade Expansion Ac, uma legislação interna que permite ações unilaterais em nome da segurança nacional, essas medidas têm como justificativa a proteção da indústria americana. No entanto, seus efeitos colaterais se espalham rapidamente e atingem, de forma dura e silenciosa, os micro e pequenos empresários brasileiros que vivem do comércio internacional.
Esses empreendedores, que muitas vezes operam em nichos específicos como mercearias de produtos típicos, lojas de importados, e-commerces ou restaurantes voltados à comunidade imigrante, agora enfrentam custos elevados, margens reduzidas e perda de competitividade. O impacto é direto e resulta em produtos mais caros para importar, preços maiores ao consumidor final e, inevitavelmente, a necessidade de rever modelos de negócio que antes funcionavam com previsibilidade.
Diante desse novo cenário, a palavra de ordem é adaptação estratégica. Muitos já começaram a revisar fornecedores, renegociar contratos e repensar a logística de seus produtos. Mas é importante destacar. Essas decisões não devem ser tomadas de forma impulsiva. Reestruturar a cadeia de suprimentos, substituir produtos por equivalentes de outros países, revisar a classificação aduaneira ou até reorganizar a estrutura jurídica da empresa são medidas que exigem análise técnica e respaldo jurídico especializado.
Segundo o U.S. Census Bureau, existem hoje mais de 13 mil negócios liderados por brasileiros nos Estados Unidos, muitos dos quais dependem diretamente da importação de produtos do Brasil. Com a imposição das novas tarifas, o ambiente se tornou mais instável e arriscado. Não se trata apenas de um ajuste tributário, mas de um reposicionamento forçado, que exige domínio sobre temas como regimes de importação, tratados bilaterais e regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).
A própria OMC, da qual tanto os Estados Unidos quanto o Brasil são membros, estabelece limites para a aplicação de tarifas. Elas não podem ser discriminatórias nem violar os princípios do GATT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio). Diante da gravidade da medida, o Brasil já considera pedir a redução das tarifas para 30% e o adiamento da aplicação por 90 dias. Mas o trâmite diplomático é lento. E, enquanto os governos negociam, o prejuízo já chegou ao empreendedor.
Além do impacto financeiro imediato, o tarifaço levanta questões jurídicas de alta complexidade. Envolve a interseção entre Direito Internacional, Direito Aduaneiro, Direito Econômico e Contratual. Muitos empresários desconhecem, por exemplo, que erros na classificação fiscal das mercadorias, algo aparentemente técnico, podem resultar no pagamento de tributos mais altos do que o necessário. Em contrapartida, uma análise precisa da classificação viabiliza regimes especiais ou benefícios previstos em tratados bilaterais.
Nesse momento, contar com uma assessoria jurídica especializada em comércio exterior e direito aduaneiro não é mais uma opção, é uma medida de sobrevivência. O profissional capacitado poderá identificar inconsistências, revisar riscos contratuais, sugerir ajustes legais e indicar caminhos viáveis para mitigar os danos causados pelas tarifas.
Além do suporte jurídico, o fortalecimento de redes institucionais também é crucial. Câmaras de Comércio, associações de apoio a imigrantes e entidades empresariais podem intermediar diálogos com autoridades, fornecer informações atualizadas e representar os interesses da comunidade brasileira nos fóruns certos.
O tarifaço, portanto, não deve ser encarado apenas como mais uma medida protecionista dos Estados Unidos. Ele representa uma ruptura que exige resposta estruturada e bem informada. Para o empreendedor brasileiro que atua na América, é o momento de profissionalizar a gestão do negócio, incorporar ferramentas de análise jurídica à rotina e agir com agilidade e precisão.
Como advogada internacional e atuante junto à comunidade brasileira em Nova York, acompanho de perto o impacto direto dessas mudanças sobre a vida de quem empreende no exterior. Minha recomendação é clara: busque orientação especializada, atualize seus contratos, reavalie sua logística e proteja seu patrimônio com base na lei.
Em tempos de instabilidade, improvisar é um risco caro. Informação, estratégia e apoio jurídico são, hoje, os ativos mais valiosos para garantir a continuidade e o crescimento de qualquer negócio que cruze fronteiras.
Sobre Rita Silva – Graduada pela Universidade Veiga de Almeida (RJ), Rita Silva é pós-graduada em Advocacia Empresarial Trabalhista – Previdenciária e Previdência Privada e em Seguro Social pela Universidade de Lisboa. É mestranda em Direito Tributário Internacional e especialista em diversas áreas que envolvem mobilidade internacional: Direito dos Expatriados, Acordos Internacionais, Previdência no Exterior, Direito de Família Internacional, Direito do Trabalho com foco em expatriação e regimes especiais de aposentadoria para aeronautas. Mais informações: https://ritasilvaadvogados.com.