Heranças para pets e caridade, uma tendência global

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O caso do testamento do magnata indiano Ratan Tata e o ponto de vista do direito brasileiro

 

Em um caso que causou surpresa e levantou debates, o magnata indiano Ratan Tata, ex-presidente do grupo Tata, que inclui marcas como Land Rover e Jaguar, deixou uma herança de mais de R$600 milhões para seus dois cães de estimação, Goa e Tito. O bilionário, falecido aos 86 anos no início de outubro, destinou parte de seu patrimônio a seus animais de estimação e também a funcionários de confiança, como o chef Rajan Shaw e o mordomo Konar Subbiah, enquanto seus irmãos ficaram apenas com uma fração da fortuna.

 

O testamento de Ratan Tata não é o único caso de herança destinada a pets ou causas pessoais. Nos Estados Unidos, por exemplo, essa prática é comum e amplamente aceita, explica o advogado Charles Mazutti, sócio da Mazutti Ribas Stern Sociedade de Advogados. “Nos Estados Unidos, por exemplo, casos notórios incluem pessoas que deserdam familiares e preferem deixar sua fortuna a causas filantrópicas, instituições de caridade, e até mesmo a pets, conforme o desejo do testador. Além dos Estados Unidos, outro país onde é possível destinar parte do patrimônio diretamente a pets é o Reino Unido, onde a prática de deixar herança para animais de estimação é legal e aceita, permitindo que testadores criem fundos específicos para custear o bem-estar de seus pets após sua morte”, afirma.

 

Legislação brasileira

 

Mazutti explica que no Brasil, o tema apresenta limitações jurídicas, já que, embora o Código Civil brasileiro permita que o testador disponha livremente de metade de seus bens (a chamada “parte disponível”), ele não autoriza que animais sejam beneficiários diretos de herança, conforme os artigos 1.798 e 1.799. “No Brasil, por não serem considerados pessoas físicas ou jurídicas, os animais de estimação não podem ser destinatários diretos de heranças,” afirma o advogado.

 

Contudo, Mazutti reforça que há uma solução análoga para quem deseja garantir cuidados para os pets após o falecimento. “Uma alternativa é nomear uma pessoa de confiança como tutora do animal, vinculado ao encargo de destinar os cuidados necessários ao pet. Essa pessoa receberia a parte disponível da herança, com a responsabilidade de cumprir a vontade do testador,” esclarece.

 

Validade do testamento

 

Além da questão legal, há outro aspecto importante: a validade do testamento. Segundo Mazutti, o documento deve ser meticulosamente elaborado para evitar questionamentos e garantir que o desejo do testador seja respeitado. “O testamento é um ato de última vontade, mas pode ser contestado se houver indícios de vícios como coação, fraude, ou incapacidade do testador, dentro do prazo de quatro anos após a abertura da sucessão”, destaca.

 

O advogado também explica que ainda que a prática de destinar heranças a pets e a causas sociais seja menos comum no Brasil, a crescente atenção para esses casos em outros países indica uma tendência em que indivíduos querem assegurar que seu patrimônio sirva a propósitos específicos e, por vezes, mais pessoais. “Nos Estados Unidos, algumas fortunas são direcionadas a ONGs, projetos de pesquisa e iniciativas sociais, decisões que fortalecem o legado filantrópico do testador. Essa prática reflete um movimento em direção à individualização do planejamento sucessório, onde o desejo pessoal do testador ganha protagonismo. Nesse contexto é essencial que o testamento seja elaborado de maneira técnica e atenciosa, garantindo a legalidade e o cumprimento da vontade final do testador”, finaliza.

 

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