Um levantamento preocupante revela que, apesar da proibição legal, 29% dos cuidadores de crianças de até 6 anos admitem utilizar palmadas, beliscões e apertões como forma de disciplina. O dado alarmante faz parte do estudo “Panorama da Primeira Infância”, divulgado pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal e realizado em parceria com o Instituto Datafolha, que ouviu mais de 2 mil pessoas em todo o país.
O estudo também indica uma contradição: enquanto 17% dos cuidadores acreditam na eficácia desses castigos, 12% reconhecem que agridem mesmo sabendo que não é uma forma eficiente de educar. A pesquisa, que entrevistou 822 cuidadores de crianças pequenas, marca o Agosto Verde, mês dedicado à conscientização sobre a importância da primeira infância.
A Lei Menino Bernardo, em vigor há mais de uma década, proíbe expressamente castigos físicos contra crianças e adolescentes. A lei prevê advertências e programas de orientação para os agressores. A diretora-executiva da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Mariana Luz, lamenta o alto percentual identificado na pesquisa, apontando para a persistência de um padrão cultural ineficaz e danoso.
“A gente é o país do ‘eu apanhei, sim, e estou aqui, sobrevivi’”, critica Mariana Luz, em entrevista, ressaltando a necessidade de desconstruir a ideia de que violência é uma ferramenta educativa. A Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal reforça que nenhuma forma de violência contra crianças é inofensiva, alertando para os efeitos negativos no desenvolvimento, como agressividade, ansiedade e depressão.
Curiosamente, a pesquisa também revelou que 84% dos entrevistados desconhecem que a primeira infância é a fase mais importante do desenvolvimento humano. Apenas 2% souberam definir corretamente o período da primeira infância, que vai até os 6 anos, conforme a legislação brasileira. Mariana Luz enfatiza que é crucial conscientizar a população sobre a importância desse período fundamental, onde ocorrem os picos de desenvolvimento físico, motor, cognitivo e socioemocional.
Outro dado preocupante é que 96% dos entrevistados consideram que ensinar a respeitar os mais velhos é a prática mais importante para o desenvolvimento infantil. Esse dado supera outras ações comprovadamente essenciais, como conversar com a criança (88%), frequentar creche (81%) e deixá-la brincar (63%). Mariana Luz alerta para a baixa valorização da educação infantil e do brincar, que é o principal eixo de aprendizagem na primeira infância.
A pesquisa também revelou que crianças na primeira infância passam, em média, duas horas diárias em frente a telas, como televisão e celulares. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda tempo de tela limitado ou nulo para crianças menores de dois anos e, no máximo, uma hora por dia para crianças entre 2 e 5 anos, sempre com supervisão de um adulto. A diretora sugere incluir a criança nas atividades domésticas para reduzir a exposição às telas e reforça a importância da oferta de creches pelo Estado.