Pedro Ernesto Macedo- Jornalista
Durante muitos anos, a medicina foi ensinada como um caminho linear: estudar muito, se especializar, atender bem os pacientes e, como consequência natural, construir uma carreira sólida. Na prática, porém, muitos médicos descobrem cedo (ou tarde demais) que a realidade é bem diferente.
Hoje, o que mais vejo são profissionais tecnicamente excelentes, extremamente dedicados, trabalhando cada vez mais, assumindo múltiplos plantões, abrindo clínicas ou consultórios próprios, mas ainda assim sentindo que algo não fecha. A agenda até pode estar cheia, mas o crescimento não evolui. O cansaço aumenta. A satisfação diminui. Viram escravos do próprio sonho concretizado.
Isso não acontece por falta de competência médica. Acontece porque ser um bom médico nunca foi suficiente para sustentar uma carreira saudável no longo prazo e ninguém falou sobre isso durante a formação.
A faculdade ensina a diagnosticar doenças, interpretar exames e salvar vidas. Tudo isso é essencial. Mas ela raramente prepara o médico para lidar com decisões estratégicas, posicionamento profissional, gestão de clínica, negócio, empresa, comunicação com o mercado e, principalmente, com a construção de autoridade fora do ambiente acadêmico.
O resultado é previsível: médicos altamente qualificados tentando crescer sem estrutura, sem clareza de posicionamento e sem uma estratégia consistente. Muitos acabam reféns de volume, de plantões intermináveis ou de modelos de negócio que não respeitam seus limites físicos, emocionais e financeiros. E aí acontece o previsível nessa situação: os que cuidam e salvam vidas adoecem.
Nos últimos anos, outro fenômeno ganhou força: a presença digital. As redes sociais passaram a ser vistas como solução para todos os problemas da carreira médica. Muitos acreditaram que bastava produzir conteúdo, ganhar seguidores e aparecer com frequência para que autoridade, reconhecimento e faturamento viessem automaticamente.
Mas isso também se mostrou uma armadilha.
Visibilidade não significa posicionamento e seguidores não é autoridade. E crescer no digital sem uma base sólida pode expor o médico a riscos profissionais, éticos e emocionais. Não são poucos os casos de frustração, comparação constante, esgotamento e perda de identidade profissional nesse processo.
Autoridade médica real não se constrói apenas com presença. Ela se constrói com coerência. Com clareza de proposta. Com decisões alinhadas entre prática clínica, comunicação, gestão e valores pessoais e profissionais.
Outro ponto pouco discutido é que muitos médicos entram no empreendedorismo sem perceber que abrir uma clínica não significa apenas atender pacientes em outro endereço. Significa liderar equipe, entender de custos, processos, experiência do paciente, regulamentações, vigilância sanitária, marketing responsável e tomada de decisão estratégica.
Sem essa visão, o consultório vira uma extensão do plantão, só que com mais cobrança, responsabilidades e menos previsibilidade (retorno financeiro).
O problema não é querer crescer. O problema é tentar crescer sem mudar a mentalidade. O médico que deseja evoluir precisa entender que, em algum momento, será necessário deixar de atuar apenas como executor técnico e assumir o papel de líder da própria carreira.
Isso não significa abandonar a medicina. Pelo contrário. Significa proteger a medicina que se pratica, criando um ambiente sustentável, ético e estruturado para que ela continue existindo com qualidade ao longo dos anos.
Vejo muitos profissionais travando exatamente nesse ponto. Eles dominam a técnica, estudam constantemente, entregam bons resultados clínicos, mas se sentem inseguros ao tomar decisões fora do consultório. Questionam preços, duvidam do próprio valor, hesitam em se posicionar e acabam ficando invisíveis ou mal posicionados. Não basta você ser muito bom no que faz, as pessoas precisam saber disso!
Crescimento profissional exige mais do que conhecimento científico. Exige visão. Exige estratégia. Exige orientação.
Aprender sozinho custa caro. Em tempo, em energia, em erros evitáveis. Muitas decisões erradas não quebram apenas financeiramente, elas adoecem o médico, desgastam relações e distanciam o profissional da carreira que ele imaginou construir e sonhou tanto exercer.
Por isso, cada vez mais, a maturidade profissional passa por reconhecer que ninguém cresce sozinho de forma sustentável. Assim como na medicina buscamos supervisão, atualização e troca de experiências, a carreira médica também precisa de direcionamento fora do ambiente clínico.
O futuro da medicina pertence aos profissionais que conseguem unir excelência técnica, clareza de posicionamento, comunicação responsável e gestão consciente. Não aos mais barulhentos. Não aos mais expostos. Mas aos mais coerentes.
Talvez o maior amadurecimento da carreira médica seja entender que crescer não é fazer mais, é fazer melhor, com intenção, estratégia e propósito.
