Em um ato simbólico de reparação, a França restituiu a Madagascar três crânios humanos, marcando um passo importante na reconciliação pelo período colonial. Entre os restos mortais, acredita-se estar o crânio do rei Toera, último soberano independente do reino Sakalava de Menabe, um símbolo da resistência à dominação francesa. A cerimônia de entrega ocorreu em Paris, no Ministério da Cultura, com a presença de autoridades de ambos os países.
Os crânios, antes preservados no Museu do Homem em Paris, representam a violência da conquista colonial no final do século XIX. Um deles é atribuído ao rei Toera, morto e decapitado pelas tropas francesas em 1897, durante o massacre de Ambiky, mesmo após ter deposto as armas. Os outros dois crânios seriam de guerreiros que lutaram ao lado do rei.
O processo de identificação do crânio do rei Toera foi complexo, demandando extensa pesquisa antropológica. Apesar dos esforços, a identificação científica formal não foi possível devido à deterioração do DNA. Para superar essa barreira, um ritual tradicional foi realizado em Madagascar, no qual, segundo a tradição, a alma do rei identificou seu crânio através de uma mulher em transe.
O historiador Jeannot Rasoloarison, da Universidade de Antananarivo, enfatiza a importância da restituição como um reconhecimento das lutas anticoloniais e uma reparação pelos crimes cometidos durante a colonização. “O que se busca com a restituição do crânio de Ampanjaka Toera e dos outros guerreiros sakalava é uma reparação tanto memorial quanto material pelos crimes cometidos pelos franceses durante a colonização”, declarou Rasoloarison à RFI.
A lei francesa, em vigor desde junho de 2023, facilita a restituição de restos humanos mantidos em coleções públicas, permitindo que sejam devolvidos e enterrados com dignidade. Segundo o rei sakalava Georges Harea Kamamy, o retorno do crânio do rei Toera possui dimensões espirituais e de identidade cruciais para o seu povo. Ele explica que “Para os Sakalava, o retorno do rei Toera representa duas dimensões essenciais: espiritual e identitária.”
A chegada do crânio a Madagascar está prevista para 31 de agosto. Em seguida, ele será levado para Ambiky, onde rituais funerários e memoriais serão realizados antes de ser depositado no túmulo real, reunindo-se ao corpo do rei e à sua linhagem. Este ato representa um marco na história do povo Sakalava e um passo significativo na jornada de reconciliação entre França e Madagascar.